A experiência humana consciente é frequentemente comparada a um iceberg: uma pequena parte visível repousa sobre uma massa oculta.
No entanto, rascunho aqui neste ensaio, um propor:que essa analogia talvez seja estática e semienganosa.
'A profundidade não é sólida', mas uma série de camadas dinâmicas de vazio organizado, que chamarei aqui:de Substratos Conscienciais.
...Esses desígnios, não são 'lugares para onde vamos', mas estados de resolução para os quais a nossa perceção se ajusta. São 'vazios'não por estarem vazios de conteúdo, mas por estarem vazios das formas e categorias do nosso pensamento ordinário.
Os três substratos propostos:
(O Vazio Sensorial (Substrato da Matéria-Pura)
O que seria:
A camada mais profunda acessível através dos sentidos, antes que o cérebro categorize a informação em 'objetos' como 'árvore','som'ou 'dor'. É o ruído de fundo da perceção.
O que conteria:
Fenômenos não nomeados:
A experiência de uma cor antes de ser 'azul'-- é apenas uma vibração, uma densidade luminosa. O som antes de ser música ou palavra -- 'é uma textura de pressão sonora pura no tímpano'.
Sinestesia Primordial:
Uma fronteira onde os sentidos ainda não se segregaram completamente. A luz não é apenas vista, mas 'sente-se'como uma friagem ou uma pressão. O som pode ter um 'gosto espacial'.
O Tato do Tempo:
A percepção direta da passagem do tempo como uma sensação tátil, sem a medição de relógios ou memórias. É a sensação de se estar sendo arrastado por uma corrente, não o ato de observar o rio fluir.
Acesso a este substrato ocorre em momentos de espanto bruto, antes que o pensamento conceptualize o que se está a experienciar, ou em estados meditativos de profunda concentração no singular (um só som, uma só sensação).
O Vazio Emocional (Substrato do Arquétipo Sombrio)
O que seria:
Uma camada anterior às emoções nomeadas (raiva, alegria, tristeza). É o oceano a partir do qual as ondas emocionais individuais surgem. É um estado de 'potência emocional pura'.
O que conteria:
Forças, não sentimentos:
Aqui, não há tristeza,há uma contração lenta do ser.Não há alegria,há uma expansão radiante sem causa.
São padrões de energia psíquica pura, desprovidos de história ou justificação.
A Sombra Coletiva Impessoal: Não se trata dos nossos traumas pessoais, mas de um reservatório de potenciais arquetípicos: o impulso do Herói, a atração do Vácuo, a resistência do Guardião.
Estes não são personagens, mas vetores de intenção que podem moldar o nosso comportamento a partir das profundezas.
A Textura do Significado:
A experiência direta do significado antes que ele se ligue a uma ideia. É uma sensação de coerência,de ajuste,ou da sua falta (*dissonância), que depois a mente racional traduz como 'isto é importante' ou 'isto não faz sentido'.
Acesso a este substrato é raro e intenso, muitas vezes em sonhos lúcidos de profunda carga simbólica, em momentos de crise existencial ,que despedaçam a identidade, ou em estados de êxtase ou desespero absolutos ,que transcendem a causa imediata.
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O Vazio Ontológico (Substrato do Ser-Cru)
O que seria:
O substrato mais fundamental e desconcertante. É a experiência direta do fato de que algo existe em oposição ao nada. É a perceção do próprio ato de existir, despido de todos os atributos.
O que conteria:
A Pura Facticidade:
O espanto, não perante o Mundo, mas perante o fato de haver um Mundo incontrolável.e inconsciente. Incoerente.
A consciência de que a existência é um dado bruto, não um argumento lógico.
O Silêncio como Fundação:
Não um 'silêncio ausente de som', mas um silêncio 'ativo'e 'generativo', do qual a realidade manifesta -- incluindo o seu 'próprio eu' – emerge momentaneamente.
--' É o palco vazio antes, durante e depois da peça.---
A Interconexão por Pura Identidade:
Neste nível, a separação entre o 'eu'e o 'outro'dissolve-se ,não num sentimento de união, mas porque a distinção se revela uma ilusão de superfície.
Não é que todos somos um; é que só existe o Um,, e a individualidade é um padrão transitório que ele assume. É a experiência de ser o Universo a experimentar-se a si próprio.
O acesso a este substrato é o mais raro, frequentemente descrito em relatos de experiências místicas espontâneas, de 'ilusões'em contextos de quase morte, ou induzido por uma introspeção filosófica radical e destemida.
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Tríade da Profundidade: Os Silêncios Geradores
Para além do ruído da existência superficial, residem três camadas de silêncio fundamental. Estas não são ausências, mas fontes.
São os 'Silêncios Geradores', estados de pura potencialidade a partir dos quais a realidade experiencial se cristaliza.
O Limiar Umbral: O Silêncio Sensorial
A Pronúncia do Mundo
Este é o momento anterior à nomeação, onde o mundo se pronuncia diretamente aos sentidos, num idioma puro de luz, som e textura, antes de ser traduzido e diminuído/intensificado pelo vocabulário do pensamento.
O reino das impressões antes dos conceitos.
A Câmara de Resonância Pura: Onde os fenômenos são apenas ecos não interpretados da matéria.
A Fonte Fenomênica:A nascente de onde brotam todas as perceções.
O Abismo Primordial: O Silêncio Emocional
A Maré dos Arquétipos
Explicação:Antes das ondas individuais de emoção, existe a maré --uma força lenta, poderosa e impessoal que carrega os padrões arquetípicos de toda a experiência humana. É o movimento do oceano psíquico em si.
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O Catalisador Sombrio:
A forja onde os impulsos primordiais ganham potência antes de se vestirem de razão.
A Geometria do Sentir:
Onde as emoções não são nomes, mas formas puras e dinâmicas (contração, expansão, torção).
O Reservatório de Potência:
O domínio da energia psíquica em estado bruto, anterior à sua aplicação num contexto pessoal.
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A Solitude do Ser
Este não é um silêncio de solidão, mas de singularidade fundamental. É a experiência de ser o único 'substante' -- o próprio ato de existir — em um estado de pura autorreferência, antes da divisão entre sujeito e objeto.
O Alicerce do Espanto:
A base última que suscita o espanto não perante coisas, mas perante a existência em si.
A Unidade Imperturbável:
O estado onde a distinção entre o 'eu' e o 'outro'é reconhecida como uma derivação superficial de uma realidade indivisa.
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O Vazio Generativo:
O nada paradoxal que contém toda a possibilidade, o palco vazio que permite o espetáculo.
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Implicações da Teoria
Esta teoria sugere que a profundidade da experiência não é um mergulho em um abismo escuro e caótico, mas um processo de subtração. Chegamos ao mais profundo ,não adquirindo mais conhecimento ou emoção, mas retirando camadas de interpretação, categorização e narrativa pessoal.
Os Substratos Conscienciais são Vazios Produtivos,porque a sua vacuidade de forma é a sua potência. Do Vazio Sensorial, a mente extrai a riqueza do mundo percebido.
Do Vazio Emocional, a psique extrai a força para viver e criar significado. Do Vazio Ontológico, a própria consciência extrai a sua autoridade para existir.
Explorar estas regiões não é uma fuga da realidade, mas um retorno à sua fonte. É a jornada mais arriscada e recompensadora que um ser consciente pode empreender: a viagem até ao coração do próprio vazio, que o constitui e, paradoxalmente, o preenche com a possibilidade de ser tudo o que é.
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